Nos anos 80, no boom do rock nacional, surgia uma banda em Curitiba chamada Beijo AA Força. Com muito sangue punk nas veias, faziam (e fazem) uma música ligeira pra diabo. Um dos seus letristas? Marcos Prado (15/12/1961, às 22:00, Curitiba-PR).
Esta, junto com Sergio Viralobos, virou um hit: a violência é tão fascinante/ queria ter dito isto antes/ não fui eu que inventei o terror/ nada me impede de ser um monstro/ ao menos por um minuto/ enquanto esquento o pavio curto/ um simples massacre no aeroporto/ com meu detonador de dinamite/ ver estrelas não é bonito?/ se você ainda estiver vivo/ desconfie do seu bom gosto/ o defeito melhora o seu rosto (Diário de um palestino).
Em sua carta astrológica a presença de Plutão e Urano surge na casa 1, aquela que revela a face que fazemos questão de mostrar ao mundo. Esta posição entre Plutão – o Destruidor e Urano – a Verdade Seca, combina com alguém que fazia da ironia e da destruição uma estética. Para você não dizer que eu estou forçando os fatos, veja o que a astróloga Liz Greene diz a respeito desse casamento: "Urano junto com Plutão sugere uma visão política, associada a uma necessidade urgente de destruir velhas atitudes e concepções. É evidente que essa é uma combinação extremamente obsessiva e potencialmente violenta. (...) a idéia básica de urano é a liberdade contra qualquer repressão, e se vocês colocarem isso junto com a urgente necessidade emocional de Plutão, então a busca por essa liberdade não será de forma alguma particularmente gentil. As pessoas que nasceram por volta de 61 a 68 têm este aspecto. Resta saber em qual casa astrológica eles residem (essa informação depende do horário do nascimento) e com isso apontar em qual área da vida de cada um dessa geração tende a romper e a destruir velhas estruturas".
No caso do Marcos, provavelmente ele foi empurrado a assumir enquanto persona essa face Urano-Plutão.
Esta conjunção planetária é muito o espírito do punk, do do it yourself, cruza de Nietszche com Gregório de Mattos, puro niilismo. Aliás, essa geração rompe com o sonho hippie da geração anterior, da turma do Paulo Leminski, significada por um forte aspecto de Netuno, o deus do amor universal e da comunhão. Geração Urano-Plutão não espera a redenção e nem tem ilusões. Eles vieram para destruí-las. Este espírito anárquico era uma constante nos poemas de Marcos Prado. Por exemplo:
uma casinha financiadinha/ uma mulherinha e três filhinhos/ um empreguinho e um creditozinho/ tomar nos fins da semaninha/ uma cervejinha com os amiguinhos/ eta vida bosta meu deus!
Urano e Plutão estão em Virgem, no momento do seu nascimento. Acompanha mais um pouco o pensamento da Liz Greene: "Os valores que serão atacados serão os tipicamente virginianos: empregos burocráticos (...), uma existência monótona, obediência sem nenhum questionamento ao sistema, materialismo mesquinho, preocupação com a ordem e com a moralidade convencional".
Marcos Prado foi um genuíno representante desta geração. Nele os mitos são estraçalhados com uma ferocidade tremenda. Não sobra ninguém. Indivíduos da Canhota Militante, o comunismo, os amantes, a democracia, a astrologia, a posteridade, meninas burguesinhas e ele próprio são destruídos com a mesma força.
este traste que você está vendo/ conhece todos os teus defeitos
Só me resta gostar dos outros/ já que fodeu tudo/ tudo bem, existe bom e monstro (...)
Somando isso com a forte ênfase em signos de Fogo (ele é um Sagitário, Lua em Áries e Leão Ascendente) fez com que fosse uma pessoa inquieta, arteira, viva, explosiva e sedenta de espírito e velocidade. O exagero. O excesso do excesso. A gargalhada. Aqui há o exagero, tanto no entusiasmo quanto na tristeza.
Não o conheci pessoalmente, mas com essa configuração no mapa imagino que ele deve ter sido uma pessoa que estava sempre pronto para liderar (Lua em Áries) contagiando a todos com seu pensamento e entusiasmo (Sol-Mercúrio em Sagitário). Ao mesmo tempo, sincero como um cavalo, impulsivo como um grito.
Ênfase em signos de Fogo sugere uma alma rebelde que se sente preso no corpo. Porque Fogo valoriza o espírito, a alma, a fantasia, a criação, a rebeldia, o lance de trazer luz à luz. Incomoda-se um pouco com as limitações que o corpo impõe. Enfim, a pessoa é um incendiário.
Marcos Prado foi um agitador cultural. Às próprias custas. Lançou, sem estar vinculado a qualquer editora, n livros de poesia. Um atrás do outro. Nos quais compartilhava a criação com outras cabeças e corações. Inventou junto com seus parceiros (Thadeu, Roberto Prado, Cobaia, Vulcanis, Viralobos, etc.) o fazer poesia em coletivo. Essa era uma maneira de achincalhar com a sua individualista Curitiba e, principalmente, um modo de se divertir à beça.
Aquele impulso todo de destruição, indicado por seu Urano-Plutão, vai explodir na casa 4 da carta astrológica de Curitiba. A casa 4 representa valores profundamente enraizados num mapa em questão. No caso, uma vida comedida e baseada no trabalho representado pelo signo que ocupa este lugar, Virgem. Os valores da classe média que Marcos fez questão de mostrar o quanto é mediana e medíocre. É como se Plutão de Marcos, ali localizado, mostrasse todos os podres que são mantidos em segredo. Sabe quem também fez isso por ter essa mesma situação do seu mapa incidindo sobre o mapa de Salvador? Gregório de Mattos.
Marcos Prado se identificava muito com o espírito do Gregório. Principalmente com aquele da boca suja, da ironia violenta, do destruidor que o fez ganhar o singelo codinome de Boca do Inferno. Essa semelhança se vê no resgate do soneto movido a mote tão comuns a Gregório. Aliás, outra rebeldia, numa época que a “poesia concreta” (que ele odiava) e o hai-cai estavam virando regra.
Gregório acabou sendo exilado. Marcos Prado morreu em Curitiba, no dia 31 de dezembro de 1996.
se o corpo abandonar minha alma/ não tenha de mim uma idéia falsa/ não chore, mantenha a calma/ estou morto por minha causa/.../ cuidado: assim como sua mala/ o meu caixão não terá alça
Morreu num dia no qual invariavelmente há expectativa de festa. Fez de propósito.
João Acuio
p.s.: J. Acuio é astrólogo, reside em Curitiba e posssui um blog: Num dia de Júpiter, na hora de Marte
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